terça-feira, 30 de agosto de 2011

A construção do conhecimento SEGUNDO PIAGET



A Organização e a Adaptação
                                                                        Malcon Tafner, MSc


Jean Piaget, para explicar o desenvolvimento intelectual, partiu da idéia que os atos biológicos são atos de adaptação ao meio físico e organizações do meio ambiente, sempre procurando manter um equilíbrio. Assim, Piaget entende que o desenvolvimento intelectual age do mesmo modo que o desenvolvimento biológico (WADSWORTH, 1996). Para Piaget, a atividade intelectual não pode ser separada do funcionamento "total" do organismo (1952, p.7) :

Do ponto de vista biológico, organização é inseparável da adaptação: Eles são dois processos complementares de um único mecanismo, sendo que o primeiro é o aspecto interno do ciclo do qual a adaptação constitui o aspecto externo.

Ainda segundo Piaget (PULASKI, 1986), a adaptação é a essência do funcionamento intelectual, assim como a essência do funcionamento biológico. É uma das tendências básicas inerentes a todas as espécies. A outra tendência é a organização. Que constitui a habilidade de integrar as estruturas físicas e psicológicas em sistemas coerentes. Ainda segundo o autor, a adaptação acontece através da organização, e assim, o organismo discrimina entre a miríade de estímulos e sensações com os quais é bombardeado e as organiza em alguma forma de estrutura. Esse processo de adaptação é então realizado sob duas operações, a assimilação e a acomodação.

Os Esquemas

Antes de prosseguir com a definição da assimilação e da acomodação, é interessante introduzir um novo conceito que é amplamente utilizado quando essas operações, assimilação e acomodação, são empregadas. Esse novo conceito que estamos procurando introduzir é chamado por Piaget de esquema (schema).

WADSWORTH (1996) define os esquemas como estruturas mentais, ou cognitivas, pelas quais os indivíduos intelectualmente se adaptam e organizam o meio. Assim sendo, os esquemas são tratados, não como objetos reais, mas como conjuntos de processos dentro do sistema nervoso. Os esquemas não são observáveis, são inferidos e, portanto, são constructos hipotéticos.

Conforme PULASKI (1986), esquema é uma estrutura cognitiva, ou padrão de comportamento ou pensamento, que emerge da integração de unidades mais simples e primitivas em um todo mais amplo, mais organizado e mais complexo. Dessa forma, temos a definição que os esquemas não são fixos, mas mudam continuamente ou tornam-se mais refinados.

Uma criança, quando nasce, apresenta poucos esquemas (sendo de natureza reflexa), e à medida que se desenvolve, seus esquemas tornam-se generalizados, mais diferenciados e mais numerosos. NITZKE et alli (1997a) escreve que os esquemas cognitivos do adulto são derivados dos esquemas sensório-motores da criança. De fato, um adulto, por exemplo, possui um vasto arranjo de esquemas comparativamente complexos que permitem um grande número de diferenciações.

Estes esquemas são utilizados para processar e identificar a entrada de estímulos, e graças a isto o organismo está apto a diferenciar estímulos, como também está apto a generalizá-los. O funcionamento é mais ou menos o seguinte, uma criança apresenta um certo número de esquemas, que grosseiramente poderíamos compará-los como fichas de um arquivo. Diante de um estímulo, essa criança tenta "encaixar" o estímulo em um esquema disponível. Vemos então, que os esquemas são estruturas intelectuais que organizam os eventos como eles são percebidos pelo organismo e classificados em grupos, de acordo com características comuns.



A Assimilação e Acomodação

A assimilação é o processo cognitivo pelo qual uma pessoa integra (classifica) um novo dado perceptual, motor ou conceitual às estruturas cognitivas prévias (WADSWORTH, 1996). Ou seja, quando a criança tem novas experiências (vendo coisas novas, ou ouvindo coisas novas) ela tenta adaptar esses novos estímulos às estruturas cognitivas que já possui.

O próprio Piaget define a assimilação como (PIAGET, 1996, p. 13) :

... uma integração à estruturas prévias, que podem permanecer invariáveis ou são mais ou menos modificadas por esta própria integração, mas sem descontinuidade com o estado precedente, isto é, sem serem destruídas, mas simplesmente acomodando-se à nova situação.

Isto significa que a criança tenta continuamente adaptar os novos estímulos aos esquemas que ela possui até aquele momento. Por exemplo, imaginemos que uma criança está aprendendo a reconhecer animais, e até o momento, o único animal que ela conhece e tem organizado esquematicamente é o cachorro. Assim, podemos dizer que a criança possui, em sua estrutura cognitiva, um esquema de cachorro.

Pois bem, quando apresentada, à esta criança, um outro animal que possua alguma semelhança, como um cavalo, ela a terá também como cachorro (marrom, quadrúpede, um rabo, pescoço, nariz molhado, etc.).



Notadamente, ocorre, neste caso, um processo de assimilação, ou seja a similaridade entre o cavalo e o cachorro (apesar da diferença de tamanho) faz com que um cavalo passe por um cachorro em função da proximidades dos estímulos e da pouca variedade e qualidade dos esquemas acumulados pela criança até o momento. A diferenciação do cavalo para o cachorro deverá ocorrer por um processo chamado de acomodação.



Ou seja, a criança, apontará para o cavalo e dirá "cachorro" . Neste momento, uma adulto intervém e corrige, "não, aquilo não é um cachorro, é um cavalo". Quando corrigida, definindo que se trata de um cavalo, e não mais de um cachorro, a criança, então, acomodará aquele estímulo a uma nova estrutura cognitiva, criando assim um novo esquema. Esta criança tem agora, um esquema para o conceito de cachorro e outro para o conceito de cavalo.

Entrando agora na operação cognitiva da acomodação, iniciamos com definição dada por PIAGET (p. 18, 1996) :

Chamaremos acomodação (por analogia com os "acomodatos" biológicos) toda modificação dos esquemas de assimilação sob a influência de situações exteriores (meio) ao quais se aplicam.

Assim, a acomodação acontece quando a criança não consegue assimilar um novo estímulo, ou seja, não existe uma estrutura cognitiva que assimile a nova informação em função das particularidades desse novo estímulo (Nitzke et alli, 1997a). Diante deste impasse, restam apenas duas saídas: criar um novo esquema ou modificar um esquema existente. Ambas as ações resultam em uma mudança na estrutura cognitiva. Ocorrida a acomodação, a criança pode tentar assimilar o estímulo novamente, e uma vez modificada a estrutura cognitiva, o estímulo é prontamente assimilado.

WADSWORTH diz que (1996, p. 7) "A acomodação explica o desenvolvimento (uma mudança qualitativa), e a assimilação explica o crescimento (uma mudança quantitativa); juntos eles explicam a adaptação intelectual e o desenvolvimento das estruturas cognitivas." Essa mesma opinião é compartilhada por Nitzke et alli (1997a), que escreve que os processos responsáveis por mudanças nas estruturas cognitivas são a assimilação e a acomodação.

PIAGET (1996), quando expõe as idéias da assimilação e da acomodação, no entanto, deixa claro que da mesma forma como não há assimilação sem acomodações (anteriores ou atuais), também não existem acomodações sem assimilação. Esta declaração de Piaget, significa que o meio não provoca simplesmente o registro de impressões ou a formação de cópias, mas desencadeia ajustamentos ativos.

Procurando elucidar essas declarações, quando se fala que não existe assimilação sem acomodação, significa que a assimilação de um novo dado perceptual, motor ou conceitual se dará primeiramente em esquemas já existentes, ou seja, acomodados em fases anteriores. E quando se fala que não existem acomodações sem assimilação, significa que um dado perceptual, motor ou conceitual é acomodado perante a sua assimilação no sistema cognitivo existente. É neste contexto que Piaget (1996, p. 18) fala de "acomodação de esquemas de assimilação".

Partindo da idéia de que não existe acomodação sem assimilação, podemos dizer que esses esquemas cognitivos não admitem o começo absoluto (PIAGET, 1996), pois derivam sempre, por diferenciações sucessivas, de esquemas anteriores. E é dessa maneira que os esquemas se desenvolvem por crescentes equilibrações e auto-regulações. Segundo WAZLAVICK (1993), pode-se dizer que a adaptação é um equilíbrio constante entre a assimilação e a acomodação.

De uma forma bastante simples, WADSWORTH (1996) escreve que durante a assimilação, uma pessoa impõe sua estrutura disponível aos estímulos que estão sendo processados. Isto é, os estímulos são "forçados" a se ajustarem à estrutura da pessoa. Na acomodação o inverso é verdadeiro. A pessoa é "forçada" a mudar sua estrutura para acomodar os novos estímulos.

Assim, de acordo com a teoria construtivista, a maior parte dos esquemas, em lugar de corresponder a uma montagem hereditária acabada, constroem-se pouco a pouco, e dão lugar a diferenciações, por acomodação às situações modificadas, ou por combinações (assimilações recíprocas com ou sem acomodações novas) múltiplas ou variadas.



A Teoria da Equilibração

Segundo Piaget (WADSWORTH, 1996), a teoria da equilibração, de uma maneira geral, trata de um ponto de equilíbrio entre a assimilação e a acomodação, e assim, é considerada como um mecanismo auto-regulador, necessária para assegurar à criança uma interação eficiente dela com o meio-ambiente.

A importância da teoria da equilibração, é notada principalmente frente a dois postulados organizados por PIAGET (1975, p.14) :

Primeiro Postulado : Todo esquema de assimilação tende a alimentar-se, isto é, a incorporar elementos que lhe são exteriores e compatíveis com a sua natureza.

Segundo Postulado : Todo esquema de assimilação é obrigado a se acomodar aos elementos que assimila, isto é, a se modificar em função de suas particularidades, mas, sem com isso, perder sua continuidade (portanto, seu fechamento enquanto ciclo de processos interdependentes), nem seus poderes anteriores de assimilação.

O primeiro postulado limita-se a consignar um motor à pesquisa, e não implica na construção de novidades, uma vez que um esquema amplo pode abranger uma gama enorme de objetos sem modificá-los ou compreendê-los. O segundo postulado afirma a necessidade de um equilíbrio entre a assimilação e a acomodação na medida em que a acomodação é bem sucedida e permanece compatível com o ciclo, modificado ou não. Em outras palavras, Piaget (1975) define que o equilíbrio cognitivo implica em afirmar que :
A presença necessária de acomodações nas estruturas;
A conservação de tais estruturas em caso de acomodações bem sucedidas.

Esta equilibração é necessária porque se uma pessoa só assimilasse estímulos acabaria com alguns poucos esquemas cognitivos, muito amplos, e por isso, incapaz de detectar diferenças nas coisas, como é o caso do esquema "seres", já descrito nesta seção. O contrário também é nocivo, pois se uma pessoa só acomodasse estímulos, acabaria com uma grande quantidade de esquemas cognitivos, porém muito pequenos, acarretando uma taxa de generalização tão baixa que a maioria das coisas seriam vistas sempre como diferentes, mesmo pertencendo à mesma classe.

Segundo WADSWORTH (1996), uma criança, ao experienciar um novo estímulo (ou um estímulo velho outra vez), tenta assimilar o estímulo a um esquema existente. Se ela for bem sucedida, o equilíbrio, em relação àquela situação estimuladora particular, é alcançado no momento. Se a criança não consegue assimilar o estímulo, ela tenta, então, fazer uma acomodação, modificando um esquema ou criando um esquema novo. Quando isso é feito, ocorre a assimilação do estímulo e, nesse momento, o equilíbrio é alcançado.

Nesta linha de pensamento em torno da teoria das equilibrações, Piaget, segundo LIMA (1994, p.147), identifica três formas básicas de equilibração, são elas :
Em função da interação fundamental de início entre o sujeito e os objetos, há primeiramente a equilibração entre a assimilação destes esquemas e a acomodação destes últimos aos objetos.
Há, em segundo lugar, uma forma de equilibração que assegura as interações entre os esquemas, pois, se as partes apresentam propriedades enquanto totalidades, elas apresentam propriedades enquanto partes. Obviamente, as propriedades das partes diferenciam-se entre si. Intervêm aqui, igualmente, processos de assimilação e acomodação recíprocos que asseguram as interações entre dois ou mais esquemas que, juntos, compõem um outro que os integra.
Finalmente, a terceira forma de equilibração é a que assegura as interações entre os esquemas e a totalidade. Essa terceira forma é diferente da Segunda, pois naquela a equilibração intervém nas interações entre as partes, enquanto que nesta terceira a equilibração intervém nas interações das partes com o todo. Em outras palavras, na Segunda forma temos a equilibração pela diferenciação; na terceira temos a equilibração pela integração.

Dessa forma, podemos ver a integração em um todo, segundo a teoria da equilibração como uma tarefa de assimilação, enquanto que a diferenciação pode ser vista como uma tarefa de acomodação. Há, contudo, conservação mútua do todo e das partes.

Embora, Piaget tenha apontando três tipos de equilibração, lembra que os tipos possuem o comum aspecto de serem todas relativas ao equilíbrio entre a assimilação e a acomodação, além de conduzir o fortalecimento das características positivas pertencentes aos esquemas no sistema cognitivo.

Os Estágios Cognitivos Segundo Piaget

Piaget, quando descreve a aprendizagem, tem um enfoque diferente do que normalmente se atribui à esta palavra. Piaget separa o processo cognitivo inteligente em duas palavras : aprendizagem e desenvolvimento. Para Piaget, segundo MACEDO (1994), a aprendizagem refere-se à aquisição de uma resposta particular, aprendida em função da experiência, obtida de forma sistemática ou não. Enquanto que o desenvolvimento seria uma aprendizagem de fato, sendo este o responsável pela formação dos conhecimentos.

Piaget, quando postula sua teoria sobre o desenvolvimento da criança, descreve-a, basicamente, em 4 estados, que ele próprio chama de fases de transição (PIAGET, 1975). Essas 4 fases são :
Sensório-motor (0 – 2 anos);
Pré-operatório ( 2 – 7,8 anos);
Operatório-concreto ( 8 – 11 anos);
Operatório-formal (8 – 14 anos);

Sensório-motor

Neste estágio, a partir de reflexos neurológicos básicos, o bebê começa a construir esquemas de ação para assimilar mentalmente o meio (LOPES, 1996). Também é marcado pela construção prática das noções de objeto, espaço, causalidade e tempo (MACEDO, 1991). Segundo LOPES, as noções de espaço e tempo são construídas pela ação, configurando assim, uma inteligência essencialmente prática.

Conforme MACEDO (1991, p. 124) é assim que os esquemas vão "pouco a pouco, diferenciando-se e integrando-se, no mesmo tempo em que o sujeito vai se separando dos objetos podendo, por isso mesmo, interagir com eles de forma mais complexa." Nitzke et alli (1997b) diz-se que o contato com o meio é direto e imediato, sem representação ou pensamento.

Exemplos:

O bebê pega o que está em sua mão; "mama" o que é posto em sua boca; "vê" o que está diante de si. Aprimorando esses esquemas, é capaz de ver um objeto, pegá-lo e levá-lo a boca.

Pré-operatório

É nesta fase que surge, na criança, a capacidade de substituir um objeto ou acontecimento por uma representação (PIAGET e INHELDER, 1982), e esta substituição é possível, conforme PIAGET, graças à função simbólica. Assim este estágio é também muito conhecido como o estágio da Inteligência Simbólica.

Contudo, MACEDO (1991) lembra que a atividade sensório-motor não está esquecida ou abandonada, mas refinada e mais sofisticada, pois verifica-se que ocorre uma crescente melhoria na sua aprendizagem, permitindo que a mesma explore melhor o ambiente, fazendo uso de mais e mais sofisticados movimentos e percepções intuitivas.

A criança deste estágio:
É egocêntrica, centrada em si mesma, e não consegue se colocar, abstratamente, no lugar do outro.
Não aceita a idéia do acaso e tudo deve ter uma explicação (é fase dos "por quês").
Já pode agir por simulação, "como se".
Possui percepção global sem discriminar detalhes.
Deixa se levar pela aparência sem relacionar fatos.

Exemplos:

Mostram-se para a criança, duas bolinhas de massa iguais e dá-se a uma delas a forma de salsicha. A criança nega que a quantidade de massa continue igual, pois as formas são diferentes. Não relaciona as situações.

Operatório-concreto

Conforme Nitzke et alli (1997b), neste estágio a criança desenvolve noções de tempo, espaço, velocidade, ordem, casualidade, ..., sendo então capaz de relacionar diferentes aspectos e abstrair dados da realidade. Apesar de não se limitar mais a uma representação imediata, depende do mundo concreto para abstrair.

Um importante conceito desta fase é o desenvolvimento da reversibilidade, ou seja, a capacidade da representação de uma ação no sentido inverso de uma anterior, anulando a transformação observada.

Exemplos:

Despeja-se a água de dois copos em outros, de formatos diferentes, para que a criança diga se as quantidades continuam iguais. A resposta é afirmativa uma vez que a criança já diferencia aspectos e é capaz de "refazer" a ação.

Operatório-formal

Segundo WADSWORTH (1996) é neste momento que as estruturas cognitivas da criança alcançam seu nível mais elevado de desenvolvimento. A representação agora permite à criança uma abstração total, não se limitando mais à representação imediata e nem às relações previamente existentes. Agora a criança é capaz de pensar logicamente, formular hipóteses e buscar soluções, sem depender mais só da observação da realidade.

Em outras palavras, as estruturas cognitivas da criança alcançam seu nível mais elevado de desenvolvimento e tornam-se aptas a aplicar o raciocínio lógico a todas as classes de problemas.

Exemplos:

Se lhe pedem para analisar um provérbio como "de grão em grão, a galinha enche o papo", a criança trabalha com a lógica da idéia (metáfora) e não com a imagem de uma galinha comendo grãos.

BIBLIOGRAFIA

LIMA, Lauro de Oliveira. In: MACEDO, Lino de. Ensaios Construtivistas. São Paulo : Casa do Psicólogo, 1994.
               Lopes, Josiane. Jean Piaget. Nova Escola. a. XI, n. 95, ago. 1996.
MACEDO, Lino. Ensaios Construtivistas. 3. Ed. São Paulo : Casa do Psicólogo, 1994.
Nitzke, Julio A.; Campos, M. B. e Lima, Maria F. P. . "Estágios de Desenvolvimento". PIAGET. 1997b. http://penta.ufrgs.br/~marcia/piaget/estagio.htm (20 de Outubro de 1997).
Nitzke, Julio A.; Campos, M. B. e Lima, Maria F. P.. "Teoria de Piaget". PIAGET. 1997a. http://penta.ufrgs.br/~marcia/piaget/ (20 de Outubro de 1997)
PIAGET, jean e INHELDER, Bärbel. A psicologia da criança. São Paulo : DIFEL, 1982.
PIAGET, Jean. Como se desarolla la mente del niño. In : PIAGET, Jean et allii. Los años postergados: la primera infancia. Paris : UNICEF, 1975.
PIAGET, Jean. Biologia e Conhecimento. 2ª Ed. Vozes : Petrópolis, 1996.
PIAGET, Jean. A equilibração das estruturas cognitivas. Rio de Janeiro : Zahar, 1975.
WADSWORTH, Barry. Inteligência e Afetividade da Criança. 4. Ed. São Paulo : Enio Matheus Guazzelli, 1996.
FODOR, J. Fixation of belief and concept aquisition. In : PIATELLI-PALMARINI, M. Language and Learning : the debate between Chomsky and Piaget. Cambridge : Harvard Press, 1980.
PULASKI, Mary Ann Spencer. Compreendendo Piaget. Rio de Janeiro : Livros Técnicos e Científicos, 1986.
FUSTER, J. Network memory. Trends In Neuroscience, v. 20, n. 10, p. 451-459, 1997.


Você deve  utilizar seus  conhecimentos,  suas  leituras  anteriores,  conhecimentos  adquiridos em  outras   disciplinas e  de  referências   complementares,  para preencher  a tabela   abaixo.



PRINCIPAIS ASPECTOS  DO  DESENVOLVIMENTO



- Esta atividade  deverá  ser entregue,  via e-mail  ou  por   documento  físico  até  o  dia   21  de   setembro.
Será um  dos  instrumentos  de G1.

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

A organização do espaço físico e do tempo na educação infantil


Dorcas Tussi* Alexandra Fatima Lopes de Souza
publicado em 10/11/2009


O que é espaço? Analisando o sentido semântico apresentado por Forneiro (apud ZABALZA, 1998, p. 230), compreendemos que significa “[...] extensão indefinida, meio sem limites que contém todas as extensões finitas. Parte dessa extensão que ocupa cada corpo”. Este conceito de espaço pressupõe algo físico que pode ser preenchido por objetos. Uma “caixa” que pode ser ocupada, esta é uma forma abstrata de ver extremamente comum entre os adultos; no entanto, a criança percebe o espaço de forma diferente, para ela não existe a abstração de algum lugar, apenas o espaço e mais tudo o que pode ser colocado nele, ou seja, espaço são equipamentos, móveis, cores etc. Para os adultos, essa percepção é a do espaço já equipado.
O espaço pode ser compreendido, ainda, dentro da noção de ambiente apontada por Forneiro (1998, p. 232), que postula que o ambiente é o conjunto do espaço físico e mais a relação que se estabelece nele. Estas relações são descritas como afetos, relações interpessoais entre as crianças, entre crianças e adultos, crianças e sociedade em seu conjunto. O espaço não é neutro. Ele permeia as relações estabelecidas e as influencia, na medida em que chega até o sujeito e propõe suas mensagens, implicitamente. Espaço é tudo e é indissociado da noção de ambiente.
Indo um pouco além desta visão formal e utilitária do espaço, podemos percebê-lo também como um “[...] espaço de vida, no qual a vida acontece e se desenvolve: é um conjunto completo”. Esta visão pode ser considerada vitalista porque se adapta à forma como a criança vê o espaço, pois ela o sente e o vê; portanto, “[...] é grande, pequeno, claro, escuro, é poder correr ou ficar quieto, é silêncio, é barulho” (BATTINI apud FORNEIRO, 1998, p. 231), a criança não o concebe abstratamente, pois ainda não tem desenvolvida esta capacidade. O que a criança pode ver restringe-se ao concreto, ao palpável. A criança vê o espaço da escola, da sua casa como algo concreto, e a partir do seu imaginário infantil o lugar para ela só é atrativo se puder interagir e vivenciar o ato de brincar. A partir disso podemos dizer que a infância é uma etapa diferenciada do mundo adulto; portanto, o seu modo de ver a vida é baseado no poder de manipular os objetos e criar formas lúdicas com eles.
Tonucci (1997) faz uma leitura crítica a partir de imagens sobre a influência que a escola e a família exercem sobre a criança procurando organizar o mundo dela com bases na noção de mundo do adulto.
Seu quarto - TONUCCI, F. Com olhos de criança. Porto alegre: Artes Médicas, 1997. p. 68.
        A forma como a criança percebe o espaço é diferente da lógica do adulto. O adulto o organiza, muitas vezes, não considerando a relevância da participação da criança na construção dele. Cabe aos professores o olhar atento para as especificidades do sujeito infantil e organizar o espaço de maneira que contemple o jogo, o brincar e o despertar do imaginário infantil. O espaço educativo deve ser prazeroso e voltado às necessidades de cada faixa etária na primeira infância.
        Ao falar de um espaço educativo não se pode deixar de mencionar a intrínseca relação entre espaço e organização. Nesse caso, percebemos a presença da geometria cartesiana como forma bastante marcante para organizar espaços. Ele é um lugar geralmente retangular, planejado, medido, ordenado, estabelecendo de maneira disciplinada os móveis e objetos; cada objeto em seu lugar determinado. Em se tratando de sala de aula há o espaço do brincar e contar histórias, o espaço para as atividades e para o lanche. Cabe salientar que juntamente com a forma disciplinada dos equipamentos da sala de aula há a disciplina do tempo. A organização do tempo em determinada atividade e espaço para cada momento da aula.
        É por essa razão que a esta discussão cabe focalizar o termo disciplinamento como categoria central de análise e também como parte integrante da educação das crianças em idade de educação infantil. Sobretudo no espaço, o disciplinamento é imprescindível. Ele permitirá atingir o objetivo de compreender quais são as estratégias de disciplinamento, pois é através da disciplina que poderemos observar as ações possíveis de autorregulação da criança no espaço educativo e seus mecanismos para essa ação. Logicamente que não se pode descartar o contexto como influente, porém a estrutura social e político-educacional está de tal forma posta e desenvolvida ao longo da história que “autoriza” a educadora, por meio dos próprios elementos constitutivos de sala (carteiras, materiais didáticos, disciplinas, regras de convivência e obediência), a práticas de disciplinamento. Isso pressupõe pensar que desde os primórdios da modernidade o homem se preocupa com a questão da disciplina.

O espaço educativo e as práticas de disciplinamento
         Pensar em disciplinamento implica pensar em tecnologias de individualização e de normatização do corpo infantil, na produção de sujeito dócil e útil. Estas tecnologias enfatizam como a escola e o Centro de Educação Infantil produzem e controlam através da organização do espaço físico o disciplinamento na criança. Kant (1996, p. 16) no século XVII já preconizava que “[...] a falta de disciplina é um mal pior que a falta de cultura, pois esta pode ser remediada mais tarde, ao passo que não se pode abolir o estado selvagem e corrigir um defeito da disciplina”. Não há pretensão de afirmar se autor está correto ou não, porém Kant, com esta ideia, permite que se promova um debate sobre a disciplina na escola. Kant (1996) foi o primeiro filósofo a caracterizar a escola moderna como responsável pelo disciplinamento dos corpos infantis nos espaços da instituição e concebe que a disciplina impede o homem de desviar do seu caminho, tendo como dever estreitá-lo, contê-lo, e através da educação instrumentalizá-lo para que retorne ao seu estado humano, ou seja, todo e qualquer manifestação de indisciplinamento às normas o homem se torna selvagem, animal. A disciplina submete o homem às leis da humanidade e o faz sentir a sua força, mas todo este processo de disciplinamento deve acontecer bem cedo; sendo assim, as crianças devem ser mandadas ainda pequenas à escola para que a disciplina tenha seu efeito sobre o seu corpo.
        A criança desde cedo é adaptada ao modelo escolar na educação infantil, pois na hora de fazer atividade deve ficar sentada e atenta ao que a professora está explicando, e a criança foge às regras é considerada sem limites e é preciso garantir mecanismos que a façam ter disciplina com o espaço e tempo da sala. A partir disso é possível pensar que a criança se torna criança, homem, mulher pela educação e ela é aquilo que a educação faz dela (KANT, 1996, p. 19).      
Para Assmann e Nunes (2000, p. 138), a arte das distribuições como uma categoria foucaultiana sobre as práticas disciplinares pressupõe que “[...] a disciplina é um tipo de organização do espaço”. Ela é uma distribuição dos sujeitos nos espaços escolares. No espaço educativo da educação infantil, trata-se de fechar, esquadrinhar e, por vezes, cercar estes lugares geometricamente para que não ocorra difusão das crianças. Para Duclós (2003, p. 2), a geometria cartesiana se pauta na importância da ordem e da medida. Para Descartes, na geometria não há dúvidas, ela é universal e simples. Assim, constituem-se a modernidade e as formas da organização do espaço educativo como verdades únicas, obtendo-se através das disposições dos materiais e objetos pedagógicos uma lógica capitalista, moderna, geométrica, lógico-matemática produzindo assim a infância.
Portanto, analisa-se a constituição do espaço juntamente com a organização colaboram na não difusão das crianças pelo espaço educativo. Cada espaço tem sua função e seu tempo de ser utilizado. Foucault (1987, p. 123), dentro da categoria arte das distribuições denomina uma subdivisão intitulada localização funcional, que tem como pressuposto compreender os espaços disciplinares como espaços úteis.
A organização do espaço colabora na criação de espaço útil, pois em determinado momento as crianças se dirigem aos cantinhos e deles é possível abstrair o máximo de proveito para que assim a professora possa realizar seu trabalho com rapidez e eficiência. Além disso, ajuda a professora a vigiar e visualizar todas as crianças ao mesmo tempo. Para exemplificar ainda mais, no espaço de atividades as crianças recortam, pintam, desenham, aprendem várias coisas. No espaço do brincar as crianças montam jogos, representam e imitam papéis sociais, pode-se averiguar que cada espaço tem sua função e ele deve colaborar na utilidade econômica do corpo e torná-lo docilizado em relação ao ambiente.
Para Foucault (1987, p. 123) quadriculamento “[...] é o princípio de localização imediata. [...] cada indivíduo no seu lugar e cada lugar um indivíduo. O espaço disciplinar tende a se dividir em tantas parcelas quando corpos ou elementos há repartir”. O quadriculamento exige, portanto, para a eficácia do poder disciplinar uma repartição o enquadramento das crianças no espaço. Quanto mais houver criação de espaços e organização do tempo em cada espaço maior é a eficácia do poder disciplinar.
Algumas exposições finais
         É central dizer aqui que a escola é um espaço que não neutro. Do mesmo modo ocorre com as instituições de educação infantil. A não neutralidade é comprovada quando se verifica que, por meio da organização e ocupação deste, planeja-se e propostas de trabalho são desenvolvidas. A criança que integra algum espaço educativo passa a ser “educada” e a relacionar-se com os objetos e materiais ali presentes e também terá seu comportamento modificado, ou seja, disciplinado.
Quando se aborda a questão do disciplinamento, a primeira impressão é a do sentido pejorativo a que esta palavra nos remete, porém esta categoria contribuiu significativamente na elaboração das análises, pois não possui conotação negativa. Foucault (1987) ajuda a compreender esta questão quando postula que a disciplina é um tipo de organização. Acrescenta que a disciplina é um conjunto de técnicas de distribuição dos corpos infantis nos espaços escolares e que tem como objetivos espaços individualizados, classificatórios e combinatórios, a fim de que as práticas disciplinares se incorporem nos sujeitos.
A educação infantil é um tempo diferente do tempo do ensino fundamental, portanto, precisa-se projetar espaços físicos que atendam ao ritmo de “ser criança” e à necessidade que elas participem da organização do espaço e tempo, estabelecendo com os profissionais que atuam com ela momento de interação e decisórios na produção destes espaços e tempos. A criança precisa encontrar no espaço educativo algo que não seja uma pré-escolarização, mas sim um ambiente que prime pela cultura infantil, seus valores e ansiedades. A infância é produzida por meio de subjetivações e não se evidencia o estabelecimento da existência de uma única ideia e correta sobre a criança, mas sim ela na sua relação com os familiares, professores(as) e amigos(as). A infância é algo de nossos saberes, de nossas tecnologias (LARROSA, 1998).
O espaço escolar é estabelecido dentro da lógica moderna de espaço fixo, sendo constituído e organizado por meio de discursos pedagógicos permeados de subjetividades. Evidenciam-se à luz das leituras que nos Centros de Educação Infantil as salas de aula têm fortes marcas “escolarizantes” (carteiras e cadeiras, quadro de giz e atividades pedagógicas). Os espaços podem, muitas vezes, ser organizados em espaços funcionais, ou seja, espaços construídos pela professora destinados a funções específicas, como o cantinho do brincar, das atividades pedagógicas e da leitura, propiciando, assim, o disciplinamento da criança.
Referências
ASSMANN, Selvino José; NUNES, Nei Antonio. A escola e as práticas de poder disciplinar. Perspectiva, Florianópolis, v. 18, n. 33, p. 135–153, jan/jul. 2000.
COUTINHO, Karyne Dias. Lugares de criança - Shopping Centers e o disciplinamento dos corpos infantis. 2002. Dissertação (Mestrado em Educação) Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, setembro. 2002.
DUCLÓS, Miguel. As meditações cartesianas e o nascimento da subjetividade moderna. Baseado nas anotações de aula da professora Marilena Chauí. Disponível em: <http://www.consciencia.org/modera/desmedi.shtml> Acesso em: 1 nov. 2003.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: o nascimento das prisões. Trad. Raquel Ramalhete. 16. ed. Petrópolis: Vozes, 1987.
FORNEIRO, Lina Iglesias. A organização dos espaços na educação infantil. In: ZABALZA, Miguel A. Qualidade em educação infantil. Trad. Beatriz Affonso Neves. Porto Alegre: Artmed, 1998. p. 229-281.

HARVEY, David. A experiência do espaço e do tempo. In: HARVEY, David. Condição pós-moderna. 6. ed. São Paulo: Loyola, 1996. p. 185-289.
KANT, Immanuel. Sobre a pedagogia. trad. Francisco Cock Fontanella. Piracicaba: Unimep, 1996.

TONUCCI, Francesco. Com olhos de criança. Porto alegre: Artes Médicas, 1997.

A construção da noção de espaço e tempo é um dos elementos fundamentais que constituem a inteligência da criança pequena. (PIAGET,1937, 1946a, 1946b; PIAGET; INHELDER, 1948). De fato, o espaço e o tempo são apontados por Kant (1980), como elementos essenciais de sensibilidade da realidade.


Como  você  entende que  deva  ser  a  organização dos  espaços para  propiciar  e  estimular o  desenvolvimento da  criança?